O fracionamento das atividades em empresas distintas, e os riscos envolvidos - ISPBLOG
Enviado em 04.01.2017

O fracionamento das atividades em empresas distintas, e os riscos envolvidos

A carga tributária que recai sobre as empresas brasileiras faz com que algumas delas realizem manobras para diminuir este custo, o que traz certos riscos.

fracionamento das atividades

Ao se tratar de qualquer atividade empresarial no Brasil e os custos direta ou indiretamente envolvidos, uma preocupação vem facilmente à tona: a elevada carga tributária envolvida.

 

E em se tratando de serviços de telecomunicações, a preocupação inerente à carga tributária é ainda maior, sobretudo se considerarmos a excessiva alíquota de ICMS incidente sobre os serviços de telecomunicações, em relação às empresas não optantes pelo Simples Nacional, ou seja, aquelas que optaram pelo recolhimento dos tributos segundo o regime de apuração do Lucro Real ou Lucro Presumido.

 

Para se ter uma idéia das alíquotas de ICMS que recaem sobre os serviços de telecomunicações, em relação a empresas não optantes pelo Simples Nacional, veja o quadro demonstrativo a seguir, onde há a especificação das alíquotas de acordo com cada Estado:

 

ESTADO ALÍQUOTA DE ICMS SOBRE TELECOMUNICAÇÕES
Rondônia 37%
Mato Grosso 32%
Alagoas, Amazonas, Ceará, Pará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Sergipe e Rio de Janeiro 30%
Amapá, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, Tocantins 29%
Bahia e Distrito Federal 28%
Maranhão, Minas Gerais 27%
Acre, Espírito Santo, Piauí, Roraima, Santa Catarina e São Paulo 25%

 

Nota-se, do quadro demonstrativo acima, que dependendo do Estado onde a empresa de telecomunicações está sediada, a alíquota de ICMS pode alcançar 37%, como é o caso do Estado de Rondônia.

 

Este cenário é ainda mais alarmante, posto que as empresas de telecomunicações possuem usualmente um limitado direito a crédito de ICMS. Em outras palavras, as empresas de telecomunicações, no levantamento de créditos de ICMS aptos a deduzir o ICMS a pagar (imposto não cumulativo), possuem um direito creditício limitado, eis que usualmente se apropriam apenas do ICMS relacionado aos serviços de telecomunicações adquiridos de terceiros.

 

Enquanto que, tais empresas, ao se apropriar de créditos de ICMS relacionados aos equipamentos de telecomunicações adquiridos de terceiros (ativo permanente), se esbarram no aproveitamento de crédito fracionado em 1/48 (regra do Controle de Crédito de ICMS do Ativo Permanente – CIAP).

 

E tais empresas, ademais, são impedidas de se apropriar de créditos relacionado aos bens adquiridos para uso e consumo, haja vista a limitação temporal prevista no Artigo 33, inciso I, da Lei Complementar n.º 87/96 (creditamento possível apenas a partir de 1º de janeiro de 2020).

 

Desta forma, devido à elevada alíquota de ICMS sobre os serviços de telecomunicações e, ao mesmo tempo, devido ao limitado creditamento de ICMS proporcionado às empresas de telecomunicações, a carga tributária de tais empresas, fora do Simples Nacional, mostra-se extremamente elevada.

 

Por outro lado, em se tratando de empresas de telecomunicações optantes pelo Simples Nacional, em que as alíquotas são variáveis de acordo a receita bruta acumulada nos últimos 12 (doze) meses, notam-se alíquotas de ICMS extremamente benéficas. Para se ter uma idéia, as alíquotas do ICMS, dentro do Simples Nacional, variam de 1,25% (faixa de receita bruta até R$ 180.000,00) a 3,95% (faixa de receita bruta de R$ 3.420.000,01 a R$ 3.600.000,00).

 

E diante das alíquotas atrativas do Simples Nacional, as empresas de telecomunicações prolongam o máximo possível suas permanências no mesmo. Até mesmo porque, a saída do Simples Nacional pode representar um salto extraordinário na carga tributária, posto que, apenas se considerarmos o ICMS, a alíquota é majorada de 3,95% para 25% a 37% (dependendo do Estado onde está sediada a empresa prestadora dos serviços de telecomunicações).

 

Sendo este cenário ainda mais prejudicial nos Estados do Acre, Amapá, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí, Rondônia, Roraima e Tocantins, posto que estes Estados adotam atualmente sublimites para efeitos de recolhimento do ICMS, ou seja, limites inferiores ao teto máximo do Simples Nacional (inferiores a R$ 3.600.000,00).

 

Isto é, os Estados do Acre, Amapá, Rondônia e Roraima adotaram, para efeitos do ICMS e em relação ao ano calendário 2016, o limite de apenas R$ 1.800.000,00. De modo que, nestes Estados, as empresas atuantes nos serviços de telecomunicações, com faturamento acima de R$ 1.800.000,00, já devem se submeter a elevadas alíquotas de ICMS (de 25% a 37%, conforme quadro acima).

 

E os Estados do Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Pará, Piauí e Tocantins adotaram, para efeitos do ICMS e em relação ao ano calendário 2016, o limite de apenas R$ 2.520.000,00. De modo que, nestes Estados, as empresas atuantes nos serviços de telecomunicações, com faturamento acima de R$ 2.520.000,00, já devem se submeter a elevadas alíquotas de ICMS (de 25% a 37%, conforme quadro acima).

 

Portanto, diante de toda a contextualização acima, chega-se a uma conclusão inarredável: atualmente, as empresas de telecomunicações têm o enquadramento no Simples Nacional como questão de sobrevivência, posto que a saída do Simples Nacional pode representar, apenas em relação ao ICMS, um aumento da carga tributária de até 1200% (mil e duzentos por cento).

 

E considerando a imprescindibilidade do Simples Nacional, o que se tem visto, em relação a algumas empresas, é a adoção de diversos expedientes com vistas a fracionar o faturamento e, com isso, prolongar o enquadramento da empresa (ou grupo de empresas) no Simples Nacional.

 

Dentre os expedientes mais comuns utilizados por algumas empresas para postergar o desenquadramento do Simples Nacional, destaca-se a criação de várias empresas, com mesma marca, no mesmo endereço, com sócios do mesmo grupo familiar, para a prestação de serviços idênticos.

 

Este tipo de expediente, todavia, tem sido bastante questionado pelo Fisco, que entende que a empresa (ou grupo de empresas) está adotando medidas fraudulentas ou dissimuladas visando reduzir a tributação a que está sujeita. De modo que, para invalidar tais “arranjos” criados com vistas ao fracionamento do faturamento, o Fisco tem se apoiado no seguinte dispositivo do Código Tributário Nacional:

 

 “Art. 116. Parágrafo único. A autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou negócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocorrência do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimentos a serem estabelecidos em lei ordinária”.

 

E para desenquadrar do Simples Nacional a empresa (ou grupo de empresas) que adotaram tais expedientes, o Fisco tem-se apoiado no seguinte dispositivo da Lei Complementar nº 123/2006:

 

“Art. 29.  A exclusão de ofício das empresas optantes pelo Simples Nacional dar-se-á quando: (…)

IV – a sua constituição ocorrer por interpostas pessoas;

  • 1oNas hipóteses previstas nos incisos II a XII do caput deste artigo, a exclusão produzirá efeitos a partir do próprio mês em que incorridas, impedindo a opção pelo regime diferenciado e favorecido desta Lei Complementar pelos próximos 3 (três) anos-calendário seguintes”.

 

É preciso compreender que existe uma linha tênue que distingue o direito subjetivo de o contribuinte organizar-se (direito à liberdade, à propriedade e à livre iniciativa, ou seja, direito ao planejamento tributário) e o direito do Estado considerar estas medidas como fraudulentas e dissimuladas (evasão fiscal).

 

Portanto, para evitar a caracterização de simulação por parte do Fisco, e por conseguinte, para evitar autuações fiscais desta natureza, é fundamental em qualquer organização de empresas e atividades, criar finalidades distintas e autônomas para cada empresa. Neste sentido, confira a seguir uma decisão do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Receita Federal), em que a mesma reconhece que a organização das atividades em 02 (duas) empresas, com o objetivo de racionalizar as operações, não pode ser considerada como simulação:

 

“CARF – CONSELHO ADMINISTRATIVO DE RECURSOS FISCAIS. Acórdão n.º 103-23.357 (23/01/2008) SIMULAÇÃO – INEXISTÊNCIA – Não é simulação a instalação de duas empresas na mesma área geográfica com o desmembramento das atividades antes exercidas por uma delas objetivando racionalizar as operações e diminuir a carga tributária;”

 

Ademais, ainda para evitar a caracterização de simulação por parte do Fisco, e por conseguinte, para evitar autuações fiscais desta natureza, é fundamental que cada empresa seja auto suficiente, ou seja, cada empresa deve custear suas próprias despesas, com recursos próprios (receitas originárias). E cada empresa deve possuir empregados e infraestrutura suficiente a cumprir, de forma autônoma e independente, seu objetivo social.

 

E cada empresa deve, ainda, possuir sócios distintos (sem relação familiar), sedes distintas, funcionários distintos, infraestrutura distinta, marca distinta e, sobretudo, finalidades distintas e autônomas.

 

Sendo importante destacar que, quanto maior a dificuldade de se implementar concretamente as recomendações acima, maior será o risco da empresa (ou grupo de empresas) sofrer questionamentos quanto ao fracionamento das atividades em pessoas jurídicas distintas que, como já destacado, pode ser considerado como ato de simulação, ao contrário de planejamento tributário.

 

Paulo Henrique da Silva Vitor
Advogado e Consultor Jurídico
Sócio Fundador da Silva Vitor, Faria & Ribeiro Advogados Associados

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